23 de novembro de 2009


















Parti, sem planos, para um local que há muito não visitava.
Que, tal como quase todos os locais desta "minha" cidade, se encontra repleto de memórias. Das minhas memórias. Das nossas memórias.
Corajosamente, as tristes, pu-las de lado.
Relembrei, em segredo, as que me aquecem a alma!
Lembro-me de um gato que dormia nas árvores num dia de Verão! Lembras-te? Até lhe tiraste um retrato!
E lembro-me da sensação de vitória quando cheguei contigo, aqui, pela primeira vez, depois de uma dura caminhada.
Hoje não vi o gato na árvore. Vi-o apenas na minha cabeça.
Sem nada dizer, apenas sorri!
O frio da tarde de Outono, com um Sol tímido a romper por entre nuvens carregadas, tornou o sítio quase deserto.
Ao longe, ouviam-se uns tiros de uns caçadores.
Mais perto, um casal passeava uns cães.
Uns peixes vermelhos que moram num lago do jardim assustaram-se e esconderam-se.
Apenas vi a cabeça pequenina de um, mais curioso, que quis espreitar-me.
Continuei e caminhei, adivinhando os trilhos de outrora.
Avistei o rio (riacho?) e as árvores. Algumas, quase sem folhas, a fazer adivinhar o Inverno que se aproxima.
O chão, molhado, estava agora cheio de cogumelos e coberto por um manto de folhas.
Cheirava a terra e podia escutar-se os pássaros.
De vez em quando, ouvia-se o barulho de um carro a fazer lembrar-me de que a cidade estava perto.
Entretanto, foram-se adensando as nuvens e a noite foi chegando.
Parti, com um sorriso.
Um dia voltarei. Talvez no Verão. Talvez encontre o gato.
Talvez voltes comigo...
Se eu regressar sozinha, tenho a certeza de que me lembrarei sempre de ti.
 
11 de novembro de 2009




Em noites de temporal,
e, às vezes, até em dias de Sol,
rompem-se os nós que me prendem
e soltam-se retalhos da minha alma.

Alguns vão com o vento.
Outros ficam caídos no chão, como as folhas do Outono.
E, tal como as folhas, são pisadas por pés descuidados.
 
1 de novembro de 2009




Esta não é a estória de um gato vulgar.
Esta é a estória do gato mais inteligente que conheço. E eu conheço muitos!
E também de um homem muito especial. Que, por acaso, é meu pai.


Eu e este gato fomos apresentados há mais de 2 anos.
Tinha sido o gatito pedido pelo meu pai e, quando chegou aqui a casa, tinha um palmo de tamanho e uns olhos curiosos.
Depressa cresceu e tornou-se um gato enorme, com uma personalidade à altura.
De mim, roubava-me descaradamente mimos sempre que eu vinha à casa-mãe!
E eu retribuía sem esforço! Sabia como ele gostava que eu lhe fizesse festas na cabeça e deixava-o deitar-se sobre os meus pés enquanto eu folheava um livro nas tardes calmas de Domingo. Nesta e em tantas outras.
Sendo, definitivamente, um gato de grande inteligência, aprendeu, desde pequeno, muitos truques e brincadeiras que nos faziam rir e que gostávamos de contar.
Aprendeu a tirar os atacadores das botas do meu pai. Sabia abrir e fechar algumas portas.
Conseguiu até arranjar uma estratégia para sair, durante a noite, da arrecadação onde dormia, deixando a janela fechada para que os outros 2 felinos não pudessem sair.
De manhã, era vê-lo feliz, à espera que saíssemos de casa! Emocionado pelas aventuras da noite, mas desejoso de uns mimos.
Quando o meu pai se reformou, aprendeu com ele as rotinas do campo e acompanhava-o a toda a parte. Era um companheiro fiel. E todos os dias observava e aprendia.
Entre outras coisas, conseguiu aprender a abrir as gaiolas onde o meu pai tinha coelhos. E, lado a lado com ele, ia abrindo e fechando as portinholas, enquanto o meu pai tratava dos animais.
Um dia, os instintos foram mais fortes. Sozinho, decidiu abrir uma porta e caçar uns quantos coelhos pequenos. O meu pai, que se encontrava por perto, apercebeu-se e, num ataque de fúria, atirou-lhe com qualquer coisa que tinha por perto.
O gato caiu como morto. O meu pai levou-o para o quintal, achando que não sobreviveria.
Estávamos, talvez, em Maio.
Durante estes meses foi quase proibido falar do episódio cá em casa.
De vez em quando lembrávamo-nos dele pois deixou-nos em herança uma gatinha muito parecida, em pelagem e em carácter.

E o gato, contra todas as expectativas, sobreviveu!
Há pouco mais de um mês vimo-lo a rondar a nossa casa. Uma vez, outra vez…
Primeiro surgia de repente e desaparecia logo de seguida. Depois foi arriscando ficar por momentos. E depois foi arrastando esses momentos.
O meu pai, que nunca foi um homem rancoroso, foi-o chamando. “Menino, menino!
Há uns dias que voltou para ficar. Já tem novamente autorização para comer e dormir por aqui.
Hoje vi-o pela primeira vez em meses.
Continua um gato imponente. Com o pêlo mais escuro, com umas quantas sequelas de uns meses de vida selvagem, mas com os mesmos olhos curiosos.
Não precisei de o chamar. Sentei-me e ele deitou-se sobre os meus pés. Como se nunca tivesse ido embora.
E encantou-me, como sempre!

Mas a razão para contar esta estória, não tem a ver com o regresso de mais um gato à família. O que me admira e quero salientar – e que me deixa orgulhosa - é a capacidade de perdão.
Do meu pai (a quem o gato roubou os coelhos) e do gato (a quem o meu pai quase matou).
Estes seres admiráveis que eu tive a sorte de ter na minha vida.
Que seja esta uma lição. Para mim e para todos os que precisamos de aprender a perdoar.

Bom Domingo!