
A minha primeira paixão foi Aveiro.
E era tal a paixão que achei que jamais iria gostar assim de outra cidade.
Ainda me lembro do vento, que nos despenteava e que partia guarda-chuvas no Inverno. Lembro-me das tardes na Biblioteca, entre livros e partilhas.
Também me lembro dos cheiros, que aprendi a conhecer e com os quais conseguia prever o tempo. Cheiro a Cacia, sinal de bom tempo.
Lembro-me das flores nos candeeiros, que pareciam mais bonitas nos Domingo de Sol. E lembro-me dos almoços de Domingo!
Ainda hoje, quando volto (e tento fazê-lo, pelo menos, uma vez por ano), Aveiro tem sempre o sabor de um regresso a casa. Como se tudo, apesar de diferente, continuasse a fazer sentido.
Quando mudei para Torres Vedras, consegui odiar a cidade durante cerca de uma tarde.
E apenas porque não era Aveiro.
Depois, rapidamente a cidade se tornou a “minha” cidade.
Quando regresso, e faço-o muitas vezes, encontro-me com as minhas memórias a cada passo.
Gosto da cor do céu, bem azul nestes dias de Verão. Gosto da brisa que corre nas ruas e que nos acaricia a pele. Gosto do pôr-do-sol na praia, especialmente em pleno Inverno.
Gosto das pessoas. Ah, as pessoas! Como gosto da simplicidade das varandas com janelas abertas!
Hoje, eram já nove da noite quando atravessei, provavelmente pela última vez, o portão da minha escola. Vim para casa e, mais uma vez, coloquei parte (o resto já levei no último sábado) da minha vida em sacos e caixas que me levantam sempre dúvidas sobre o tamanho do meu carro. É que amanhã é dia de viagem.
Nunca pensei apaixonar-me por Lisboa. Achei sempre a cidade demasiado grande para mim, como se a largura dos espaços me deixasse mais perdida e me aumentasse a solidão…
Mas a verdade é que agora, na iminência da partida, trago em mim uma certa nostalgia.
Reconheço que me sabe bem a vertigem desta cidade.
Que me permitiu ver e rever tantas pessoas que fizeram e vão fazendo parte de mim.
Que, apesar de grande, ao mesmo tempo me pareceu acolhedora, com todos os seus loucos.
Aqui todos somos iguais porque todos somos diferentes.
Aqui todos somos um bocadinho loucos…
E até na escola que hoje deixei para trás, e que durante tanto tempo me deixou ainda mais perdida, há quem me diga coisas bonitas e há quem me peça para voltar.
As pessoas! Sempre as pessoas.
Disseste-me, uma vez, que te tinhas aprendido uma coisa comigo.
Disse-te eu que são as pessoas que fazem os lugares.
E é por isso que, na hora de ir embora, um bocadinho de mim fica por cá.
E vou levar comigo bocadinhos daqueles que comigo se cruzaram.
Talvez regresse…
Ou talvez, no próximo ano, volte a apaixonar-me…